Um ano tinha envelhecido. Novamente se deslocava meu corpo indistinto, para uma escola negra, para mim radicalmente sem cor. Para muitos o lugar ideal para a sobrevivência e conservação da minha espécie. Mas este ser humano e não animal ou robotizado não partilhava do mesmo parecer. Preferia estar em casa. Preferia estar submersa em bom whisky e sentir-me asfixiada em fumo, com as minhas amigas, que hoje motivam a saudade. Como habitualmente, os meus ouvidos encontravam-se cerrados em música a um volume capaz de deixar qualquer coruja surda.
Nunca fui apologista de guardar as coisas para mim própria, razão pela qual a minha música é repartida com todos os que me envolvem. Não tinha qualquer pressa, mas naquele instante movia-me rapidamente, como se a música fosse o doping que apressa o coração e as pernas a um ritmo proporcional. Entrei na escola acelerada demais, e acabei por colidir violentamente, com um rapaz no corredor. Caí e este ajudou-me prontamente. Não retribuí, porque nunca o fiz e muito menos me dignava a descer tão baixo. Ao invés, chamei-lhe mil nomes, que acabaram por não trespassar da minha cabeça. Perdi 5 segundos do meu tempo a pensar na situação e de seguida segui para a sala de aula. A minha vontade era de desaparecer, mas já que a minha vida tinha de ser esta, decidi ponderar e concluí que não deveria gastar as poucas faltas disponíveis logo no primeiro dia. As minhas amigas já se encontravam sentadas e eu apesar de atrasada, sorri ao perceber que o professor ainda o estava mais que eu. Chegou minutos depois e para o meu espanto era a mesma pessoa com quem tinha chocado há minutos no corredor.
– Desculpem o atraso, sou o vosso novo professor e acabei por ter um contra-tempo no corredor – disse este sorrindo na minha direção.
Um contra-tempo que eu chamaria de Alicia.
A aula assemelhou-se ao mesmo de sempre, uma grande e gorda seca. Mas por alguma razão, hoje a atenção não se encontrava de baixa, porque havia ouvido tudo o que o professor tinha dito. Não conseguia perceber o que se passava na minha cabeça, o porque de este não a abandonar. Percebi que tinha de falar com alguém, era expansiva e não conseguia reter tudo no meu interior. A aula terminou, decidi assim dar uma escapadela com uma amiga minha, afim de lhe contar o sucedido. Esta era a nossa única aula do dia, por isso não existiam mais motivos de ficarmos presas aquele espaço. Fomos ambas para a minha casa. A minha mãe estava no trabalho, daqueles que o corpo faz a maior parte do dinheiro. O meu pai descansava, um descanso eterno que há muito a vida lhe ofereceu.